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Filantropia independente e comunitária está presente em várias regiões do país

Mapeamento identifica organizações independentes que trabalham com doações para grupos e movimentos da sociedade civil que atuam nas áreas de justiça social e desenvolvimento comunitário no país


Por Mônica C. Ribeiro


Realizado pela Rede Comuá em parceria com a ponteAponte, o mapeamento de fundos temáticos, comunitários e fundações comunitárias independentes que trabalham com doações para organizações da sociedade civil nas áreas de justiça social e desenvolvimento comunitário identificou 31 delas em diferentes regiões e agendas prioritárias.


A mobilização de recursos financeiros de fontes diversificadas e a doação direta de recursos para iniciativas da sociedade civil nas áreas mencionadas acima são as principais características que delimitam o universo desse mapeamento, que buscou identificar organizações filantrópicas independentes. Por sua vez, as doações indiretas, os processos de construção conjunta de editais e comunicação contínua definem os modos de operação desse conjunto de organizações identificadas.


As organizações mapeadas estão localizadas em 10 estados brasileiros e no Distrito Federal: 58% na região Sudeste, 23% no Norte, 13% no Nordeste e 3% nas regiões Centro Oeste e Sul. Esses dados revelam que essa forma de fazer filantropia acontece em todo o país.



Em comum, as doações realizadas pelas organizações filantrópicas independentes são fundamentadas na ideia de que o uso dos recursos e o poder de decisão são de responsabilidade de quem recebe as doações, sendo eles/elas os/as protagonistas sobre sua atuação.


As organizações mapeadas contribuem para pautas de igualdade racial, populações indígenas e tradicionais, meio ambiente, gênero, sexualidade, entre outras, e que tem como foco as populações que têm seus direitos negados historicamente.


A doação de recursos financeiros – através de estratégias diversificadas de grantmaking – para organizações e iniciativas da sociedade civil tem se mostrado um dos caminhos relevantes para contribuir com o seu fortalecimento e no apoio às lutas pelo reconhecimento e acesso a direitos, num sentido amplo, conduzidas pelos grupos, coletivos e movimentos junto às minorias políticas.


Dentro do universo mapeado, também foi possível observar organizações que atuam para o desenvolvimento comunitário de uma localidade específica, conectando o foco territorial com os temas de justiça social.



Surgimento e perfil das organizações mapeadas


O surgimento dos fundos locais independentes a partir dos anos 2000 implicou um processo de transformação não apenas da filantropia brasileira, mas também da sociedade civil, porque eles se instalaram como uma alternativa efetiva de financiamento e fortalecimento de pequenas e médias organizações e de movimentos que atuam no campo da justiça social e desenvolvimento comunitário.


Os anos 2000 foram um período caracterizado pela retirada da Cooperação e da filantropia internacional, motivada pelo entendimento de que o Brasil contava com uma economia estável e em desenvolvimento e com uma democracia e instituições sólidas. Certamente, esse processo gerou um grande vácuo no financiamento das organizações e iniciativas da sociedade civil, situação que impactou a sua sustentabilidade financeira e em alguns casos levou ao fechamento definitivo de instituições sem fins lucrativos.


Nesse contexto, os fundos independentes que surgem ao longo desse período (entre os anos 2000 e 2010) ocupam um lugar estratégico para dar resposta à crise de financiamento, já que muitos deles foram criados por ativistas oriundos dos movimentos, com um conhecimento sólido sobre o campo, de suas necessidades e demandas, e com capacidade de articulação em redes nacionais e internacionais.


Ao longo desse período foram criados: Fundo Elas +, BrazilFoundation, Fundo Casa Socioambiental, Fundo Brasil de Direitos Humanos, Icom e Instituto Baixada. Levando em conta a necessidade de expandir o financiamento da sociedade civil e o modelo bem-sucedido da filantropia independente, partir de 2010 começa a surgir um novo grupo de organizações filantrópicas, inspirado nas experiências dos fundos criados na etapa anterior que, ao mesmo tempo, contribuíram com a sua fundação e desenvolvimento a partir do compartilhamento de aprendizados, e até através de apoios financeiros, com o intuito de fortalecer e expandir o campo.


Neste grupo podemos identificar o Fundo Baobá, iCS, Casa Fluminense, FunBEA, Positivo e mais recentemente o Instituto Procomum, Podáali - Fundo Indígena da Amazônia Brasileira, organizações comunitárias, tais como o Fundo Babaçu do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB) e Fundo Agbara.

















Base: 31 organizações mapeadas

Nota: A somatória do gráfico pode não ser 100% devido a arredondamentos.

Fonte: Mapeamento de Organizações Independentes Doadoras nas Áreas de Justiça Social e Desenvolvimento Comunitário no Brasil, 2022
















Base: 31 organizações mapeadas

Nota: A somatória do gráfico pode não ser 100% devido a arredondamentos.

Fonte: Mapeamento de Organizações Independentes Doadoras nas Áreas de Justiça Social e Desenvolvimento Comunitário no Brasil, 2022



A pesquisa revela que entre as organizações mapeadas, 55% iniciaram a atuação a partir da doação de recursos financeiros e não financeiros, 26% apenas com apoios não financeiros e apenas 16% iniciaram as atividades somente com doações financeiras (1). Esses dados revelam que as organizações independentes conseguiram se estruturar em curto prazo para atuar no campo das doações e em estratégias de fortalecimento da sociedade civil.

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(1) 3% das organizações mapeadas não haviam iniciado sua atuação planejada, doações financeiras e não financeiras, até agosto de 2022.



A presença dessas organizações no ecossistema filantrópico ganha destaque a partir do ano 2000 e continua crescendo a cada período. É importante destacar que 23% do universo mapeado está integrado por “novas organizações” que começaram a doar entre os anos 2020 e 2022, informação que indica que o movimento da filantropia independente ganhou outro fôlego.


Com o aumento de organizações doadoras, os temas de atuação vão se tornando mais diversos também. A partir de 2000 as agendas de gênero, promoção de igualdade racial e combate ao racismo e desenvolvimento comunitário se tornam mais presentes na atuação das organizações mapeadas. É nesse período que vemos surgir organizações como o ELAS+ Doar para Transformar que tem como foco de doação organizações e movimentos de mulheres e pessoas trans, assim como o Fundo Positivo, Fundo Brasil de Direitos Humanos e o Fundo Baobá.


O direcionamento de doações para comunidades indígenas, quilombolas, ribeirinhas, tradicionais e para projetos socioambientais e de agricultura familiar também se torna foco de atuação destacada, com a atuação de organizações como o Fundo Casa Socioambiental, Fundo Dema e Instituto Juruti Sustentável - IJUS, que atuam em regiões específicas do território da Amazônia brasileira.


Os temas de cultura, educação, juventude e empreendedorismo começam a ser destacados como prioridade já entre 2000 e 2009. Entretanto, é entre as organizações criadas a partir de 2010 até 2019 que ganham maior relevância. Por sua vez, é importante destacar que o Fundo Positivo é a única organização mapeada que atua na promoção de direitos no campo da saúde com foco em iniciativas direcionadas para IST e HIV.